quarta-feira, maio 30, 2007

Crónica de Tiago Pereira (Emissão 18)

Como realizador, a minha posição dentro do movimento da tradição e da música popular portuguesa, é absolutamente comprometida. Se por um lado penso que a memória é absolutamente importante e que o trabalho ainda não foi feito, por outro lado, acho que essa memória, esse património deve ser partilhado e posteriormente remisturado e reconstruído e nunca acabar em espólios e prateleiras cheias de pó sem sentido. A alfabetização da memória é tão importante como aprender a ler. Quando conseguirmos trocar as memórias, como trocamos as letras podemos ter a certeza que sabemos mesmo quem somos e a nossa criatividade será muito maior. Se não tivermos matéria-prima, não podemos criar e esta criação deve cada vez mais unir as raízes, a tradição oral, os sons e as memórias às tecnologias, podendo assim o popular conquistar públicos e tornar-se verdadeiramente contemporâneo. A revolução do 25 de Abril não chegou à música popular, continua-se a cultivar o medo de ser folclórico e rural, em vez de se alterar o folclore e transformá-lo noutra coisa qualquer. Num produto artístico que englobe várias disciplinas e toque em muitos pontos. A necessidade uma sonoridade Portuguesa é ainda imperativa. Basta ver a ainda grande quantidade de grupos que se dizem de cariz popular e só tocam música irlandesa e francesa, para não falar da falta de iniciativa de alguns músicos que não ousam gravar discos com velhinhas Cantadeiras do Alentejo ou de trás os montes. De facto as músicas do mundo, ainda nos são pequenas. A REVOLUÇÃO PRECISA-SE. Porque na verdade a mentalidade do jovem de trás os montes, que não gosta dos burros, porque os burros são sinónimo de ruralidade e terceiro mundo e gosta é de motas e de tunning, também se aplica a este mundo da música popular, onde mais vale importar a sonoridade do states e das irlandas, que trabalhar a nossa e exporta-la para o mundo fora. E isso é bem mais possível do que se pensa.
Tiago Pereira
(Realizador e videasta)